sábado, 2 de agosto de 2014

AGOSTO/2014: ESKELETOS NO ARMARIO

O internauta Evandro de Albuquerque Queiroz volta com a seguinte
questão: "Glauco, pergunto por que KILO e KALEIDOSCOPIO você escreve só
com 'K' e palavras typo KOSMO ou KALENDA tambem apparecem com 'C' na
antiga orthographia, si tudo que era 'K' no grego virou 'C' no latim."


Bem, Evandro, grego e romano são alphabetos differentes, mas no geral a
regra seria translitterar "K" para "C" e "KH" para "CH", como sempre
fizeram os latinos, mas a praxe classica abriu varias excepções e a
praxe scientifica consagrou outras tantas. No caso de KILO
(originalmente KHILIO), que indica milhar e differe de CHYLO (succo
digestivo), o graphema se consolidou mais por conta de palavras
derivadas, como KILOMETRO e KILOGRAMMA, cujas abbreviações km e kg
continuam vigorando com "K". A rigor, taes palavras deveriam ser
escriptas como CHILIOMETRO e CHILIOGRAMMA (assim como existe
CHILIOGONO), mas a historia ja registrou o antepositivo como KILO. No
caso de KALEIDOSCOPIO a explicação é mais complexa. Occorre que, do
grego para o latim e deste para nós, alguns digrammas vocalicos
synthetizaram-se em vogaes simples, como os diphthongos "AI" de PAIDEUMA
(que deu "E" em PEDEUMA) ou "OI" de OIKO (que deu "E" em ECOLOGIA),
inclusive o "EI" de KALEIDO, que daria "I" em CALIDOSCOPIO. A rigor, a
palavra translitterada ficaria assim, CALIDOSCOPIO, onde o antepositivo
CALIDO se confunde com o latinismo CALIDUS, que significa "quente" e não
"bella forma" como o KALEIDO grego. Para fazer a distincção e manter o
diphthongo "EI", optou-se coherentemente por manter tambem o "K" da
forma original. Em outros casos, a manutenção do "K" se deve apenas à
tradição, como em KLEPTOMANIA, ou então à digraphia, como em CYSTO e
KYSTO. Aqui o "K" é necessario para evitar a utilização do digramma
"QU", que não existe no grego, só no latim. Dahi por que a palavra
SKELETON virou SCELETUS em latim e, para restaurar a pronuncia, voltou a
ser SKELETON no inglez. Em portuguez teria que ser ESKELETO, pois
SCELETO acabaria virando CELETO na graphia reformada. A peor coisa neste
caso foi transformar o vocabulo em "ESQUELETO", que é litteralmente
monstruoso, verdadeira palavra-frankenstein, nem grega, nem latina, nem
vernacula. Si fosse para mixturar as origens, melhor seria usar duma vez
o "K" com maior frequencia, a exemplo de KERATINA, KEROSENE, KOSMO,
KALENDA, KARMA, KERMESSE, KIMONO, e por ahi vae. Aliaz, do grego para o
latim tambem o digramma "KH" passou a "CH", como em CHORUS ou CHARISMA,
o que gerou conflictos prosodicos no portuguez, ja que CHORO tanto
poderia ser canto como pranto, dependendo da funcção do "H" no digramma.
Si desde o latim fosse usado o "K", ficaria facil differenciar KHORO de
CHORO. Isso só não occorreu porque em latim o "C" tinha valor guttural e
não egual ao nosso "S" deante das vogaes "E", "I" e "Y". Agora é
secularmente tarde, ou antes, millennarmente, para mexer nisso e nenhuma
reforma poderia aterrorizar um etymologista mais do que ja nos apavora
esse cadaverico "ESQUELETO"...


Envie sua questão a mattosog@gmail.com ou seu pedido para receber uma
copia digital do DICCIONARIO ORTHOGRAPHICO de Glauco Mattoso.


///