sábado, 29 de junho de 2013

JULHO/2013: "VOCABULARIO MEDONHO"

Entre as innumeras inconveniencias da graphia phonetica está a confusão
de etymologismos como "hippo" (cavallo) e "hypo" (abaixo): os
reformistas escrevem, indistinctamente, "hipódromo" e "hipótese", quando
deveriam escrever "hippodromo" e "hypothese". Peor ainda: ora escrevem o
mesmo graphema dum jeito, ora doutro, como "gymno" (nudez), que figura
como "gin..." em "ginásio" e "ginástica" (correctamente, "gymnasio" e
"gymnastica") e como "gimn..." em "gimnocéfalo" (correctamente,
"gymnocephalo"), lembrando, ademais, que "gymno" não pode ser confundido
com "gyno" (mulher), a exemplo da palavra "gymnogyno", que os
phoneticistas escrevem "gimnógino".

Ja quem escreve, como eu, pelo systema etymologico apprende a distinguir
os hellenismos, como "philo" (em "philogynia") e "phyllo" (em
"phyllogenia"), que os phoneticistas grapham, equivocadamente,
"filoginia" e "filogenia".

O conhecimento dos etymologismos grecolatinos é particularmente util na
hora de cunharmos neologismos, ainda mais os do typo hybrido. Querem
ver? O melhor laboratorio de novos termos scientificos, ou até
pseudoscientificos, está na covardia da especie humana. Acho que não ha
animal mais medroso que o homem, a julgar pela quantidade e pela
diversidade de phobias que rotulamos no quotidiano: a cada hora nos
apavoramos com algo que, geralmente, nem representa perigo. Ahi surgem
differentes nomes para o mesmo medo, comprovando que o medo é maior que
qualquer tentativa de baptizal-o. Examinemos os terrores mais communs
que nos assombram.

Um exemplo typico é o medo de avião. Uns o baptizam de
"aerodromophobia", onde "dromo" significa o acto do percurso. Assim, o
percurso por via ferrea seria "siderodromo", donde o medo de viajar de
trem: "siderodromophobia". Outros preferem "ptesiophobia" para o medo de
voar. Si o medo for do mar, temos "thalassophobia". Si for de rios,
"potamophobia". Si for de lagos, "limnophobia". Ahi basta enxertar o
affixo "dromo" para as viagens, typo "potamodromophobia", que pode
incommodar alguem que receie palavras compridas, ou seja, alguem que
soffra de "sesquipedalophobia". Aliaz, esse coitado terá muitos motivos
para se intimidar si for pesquisar o vocabulario das coisas que nos
ameaçam. É capaz de ficar com medo de sentir medo, isto é, a chamada
"phobophobia".

Si usassemos apenas "dromophobia", seria para nos referirmos ao medo de
andar pelas ruas, de simplesmente perambular. Si quizessemos especificar
o medo de percorrer ou atravessar estradas, poderiamos usar "hodophobia"
e, no caso de usar ou cruzar pontes, "gephyrophobia". Si o sujeito ja
fica apavorado só por caminhar, soffre de "ambulophobia". Si o que elle
teme é desequilibrar-se ao andar ou ficar de pé, soffre de "basiophobia"
ou de "estasiophobia". Si teme manter a cabeça erguida, soffre de
"geniophobia".

E no caso de embarcar em vehiculos mais corriqueiros? Andar de carro dá
medo? Então seria "amaxophobia". Si o sujeito tem medo da velocidade,
tem "tachophobia", onde apparece o mesmo graphema de "tachographo". Si
teme dirigir pela mão direita ou virar à direita, tem "dextrophobia". O
mesmo vale para objectos do lado direito do corpo. No caso da mão
esquerda ou do lado esquerdo, tem "sinistrophobia".

Por fallar em sinistros, outro sentido do termo tem a ver com tudo que
envolve a morte ou os mortos. Alem da "thanatophobia", temos a
"necrophobia". Mais especifico é o medo de ser enterrado vivo, a
"taphophobia". O medo de phantasmas é a "espectrophobia". O medo das
sombras é a "sciophobia" ou "esciophobia". O medo dos sonhos é a
"onirophobia". Outros teem medo de vestigios mais palpaveis, como os
vermes, caso da "escolecophobia".

O medo de morrer remette ao campo da saude, fonte da maior parte das
nossas preoccupações. O medo de sentir dor é a "algophobia" ou
"odynophobia". O medo de sentir fraqueza ou de desmaiar é a
"asthenophobia". O medo de ficar doente é a "nosophobia" ou a
"pathophobia". O medo de ficar louco ou pegar raiva é a "lyssophobia".
Para a raiva tambem vale a "hydrophobophobia". O medo de ter febre é a
"pyretophobia". O medo de vomitar é a "emetophobia". O medo de
envenenar-se é a "toxophobia". O medo de intoxicar-se, de aspirar
polluição ou de engolir ar é a "aerophobia". O medo de contaminar-se por
germes é a "mysophobia", cujo graphema não pode ser confundido com o
"miso" de "misogynia", que equivale à "gynophobia" ou aversão às
mulheres. Ja o medo de contaminar-se pela sujeira é a "molysmophobia". O
simples medo de immundicie é a "rhypophobia". O medo de poeira é a
"coniophobia". O medo ou nojo de substancias viscosas é a "myxophobia"
ou "blennophobia". O medo de hospitaes é a "nosocomiophobia". O medo de
ir ao medico é a "iatrophobia". De dentistas, a "odontologophobia". Para
quem tem medo de doença incuravel o termo pode ser "monopathophobia".
Para doenças venereas, "cypridophobia" ou "cyprinophobia". No caso da
syphilis, "syphilophobia". Para a tuberculose, "phthisiophobia". Para
doenças de pelle, "dermatopathophobia". E assim por deante. O medo de
ficar enrugado é a "rhytidophobia". O medo de ficar careca é a
"phalacrophobia". O medo das deformidades é a "dysmorphophobia". Quanto
ao medo de cirurgia, seria a "tomophobia"; de sangue, a "hemophobia" ou
"hematophobia"; de injecção, seria "trypanophobia", lembrando que existe
"rhaphidophobia" para agulhas e "belonophobia" para alfinetes. O medo de
machucar-se physicamente é a "traumatophobia". Para os hypochondriacos
ha um prato cheio no campo dos medicamentos. O medo de tomar remedio é a
"pharmacophobia". No caso de remedios novos, "neopharmacophobia". No
caso de remedios à base de mercurio, "hydrargyrophobia". O proprio
medico, si tiver medo de operar, tem "ergasiophobia".

Outro terreno fertil aos medos é o convivio social ou seu opposto, o
isolamento. Si o sujeito não consegue ficar sozinho, tem "autophobia",
"monophobia" ou "eremophobia". Si não consegue ficar em casa, tem
"domatophobia". Si sae e não quer voltar, tem "nostophobia". Si tem medo
de agglomerações, soffre de "ochlophobia" ou de "demophobia". Si teme
logares abertos e publicos, tem "agoraphobia". Si teme logares abertos e
altos, tem "aeroacrophobia". Si teme logares estreitos, tem
"estenophobia". Si teme logares fechados, tem "claustrophobia". Si teme
ficar trancado, tem "clitrophobia". Si teme logares suppostamente
perigosos, tem "topophobia". Mesmo entre os que não soffrem de
"sociophobia" ou "anthropophobia" ha excepções: uns teem aversão a
creanças, a "pedophobia", outros a velhos, a "gerontophobia", outros a
pessoas deformadas, a "teratophobia", outros aos parentes, a
"syngenosophobia", outros aos proprios filhos, a "hyiophobia" ou
"huiophobia", outros aos extrangeiros, a "xenophobia", outros aos
homosexuaes, a "homophobia". Quem não quer depender dos outros tem
"soteriophobia". Quem não supporta ouvir vozes ou ruidos tem
"phonophobia". Quem não consegue fallar ou discursar tem "lalophobia" ou
"glossophobia". Quem tem medo das palavras tem "logophobia", e de certos
nomes tem "onomatophobia". Quem tem medo do ridiculo tem
"catagelophobia". Quem tem medo de se ruborizar tem "ereuthophobia".
Quem tem medo de ser observado tem "escopophobia". Quem tem medo de
dansar tem "chorophobia". Quem não quer ser tocado nem tocar tem
"hapheophobia". Si for com a mão, tem "chiraptophobia".

Funcções physiologicas normaes e actos communs ou rotineiros podem ser,
para alguns, fonte de temor, como alimentar-se ou engolir a comida,
casos de "sitiophobia" e de "phagophobia". O medo de jantar ou de
conversas ao jantar é a "dipnophobia". O medo de beber ou ingerir
liquidos é a "dipsophobia". O medo dos lacticinios é a "galactophobia"
ou "lactophobia". O medo da gravidez é a "tocophobia". O medo do parto é
a "lochiophobia" ou "maieusophobia". O medo de sentar-se é a
"cathisophobia". O medo de deitar-se é a "clinophobia". O medo de dormir
é a "hypnophobia". O medo de trabalhar é a "ergophobia", accusada de ser
desculpa para a preguiça. O medo de tomar banho é a "ablutophobia". O
medo de mijar ou da urina é a "urophobia". O medo de cagar ou da merda é
a "coprophobia". O medo de peidar ou respirar taes ares é a
"flatophobia".

Nossa paranoia com a segurança causa medos como a "hyalophobia"
(cortarmo-nos com vidro), a "catoptrophobia" (espelhos), a
"erythrophobia" (luz vermelha), a "climacophobia" (degraus e escadas), a
"hypsophobia" (altura), a "abyssophobia", "acrophobia" ou "cremnophobia"
(precipicios), a "bathophobia" (profundidade), a "dinophobia" (vertigens
e redemoinhos), a "cinetophobia" (movimentos), a "chronometrophobia"
(relogios), a "mechanophobia" (machinas), a "hoplophobia" (armas de
fogo), a "ballistophobia" (misseis), a "kleptophobia" (sermos roubados),
a "nyctophobia" (sahirmos à noite) e a "ataxophobia" (desordem).

O amor e o sexo não poderiam faltar na lista dos cagaços. Só de beijar
ou ser beijado alguem sente medo, a "philemophobia" ou
"philematophobia". De enamorar-se existe a "philophobia". De casar, a
"gamophobia". De sentir prazer, a "hedonophobia". De se excitar, a
"erotophobia". De sentir dor durante o acto, a "erectophobia". De ser
sexualmente abusado, a "contrectophobia". De putas, a "cypriphobia" ou
"cyprianophobia", que vale tambem para doenças venereas.

Phenomenos climaticos e naturaes podem gerar varios typos de medo. O
nascer do sol ou a luz do dia gera a "phengophobia". Si for de qualquer
claridade, o problema é a "photophobia". Si for do céu, o medo é a
"uranophobia". Si for do sol, o medo é a "heliophobia". Si for da lua ou
do luar, é "selenophobia". Si for das estrellas, é "siderophobia", mesmo
graphema do aço nas ferrovias. Si for do calor, o medo é a
"thermophobia". Si for do frio, o medo é a "psychrophobia"; do
congelamento, a "cryophobia". Si for do fogo, é "pyrophobia". Si for da
seccura ou da aridez, é "xerophobia". Si for da humidade, é
"hygrophobia". Si for da chuva, é "ombrophobia". Si for dos relampagos e
trovões, é "astrapophobia", "brontophobia" ou "ceraunophobia". Si for da
neve, é "chionophobia". Si for dos nevoeiros, é "nephophobia". Si for do
vento ou das correntes de ar, é "anemophobia". Si for das ondas ou
ondulações, é "cymophobia". Si for da madeira ou das florestas, é
"xylophobia" ou "hylophobia". Si for das arvores, é "dendrophobia". Si
for das flores, é "anthophobia".

Si os animaes inoffensivos despertam panico ou nojo em muita gente, que
dizer dos aggressivos? O medo de animaes, ou "zoophobia", se
particulariza na "cynophobia" (cães), na "elurophobia" ou "galeophobia"
(gattos), na "musophobia" ou "murophobia" (rattos), na "ornithophobia"
(passaros), na "alectorophobia" (gallinaceos), na "chenophobia"
(gansos), na "ichthyophobia" (peixes), na "selachophobia" (tubarões), na
"ophidiophobia" (cobras), na "batrachophobia" (sapos e rans), na
"herpetophobia" (repteis), na "entomophobia" (insectos), na
"melissophobia" (abelhas), na "esphecophobia" (vespas e marimbondos), na
"myrmecophobia" (formigas), na "isopterophobia" (cupins), na
"blattophobia" (baratas), na "arachnophobia" (aranhas e escorpiões), na
"acarophobia" (pequenos organismos), na "bacillophobia", na
"bacteriophobia" e na "microbiophobia" (microorganismos). E por ahi vae.

O terreno espiritual e moral tambem é foco de medos, obviamente. O medo
vae do mero apprendizado ou do conhecimento, chamado de "sophophobia",
"epistemophobia" ou "gnoseophobia", até as mais altas divindades, a
"theophobia", passando pelo inferno, a "hadephobia" ou "estygiophobia",
pelos sanctos, a "hagiophobia", pelos sacerdotes e pelas coisas
sagradas, a "hierophobia", pelos mythos e lendas, a "mythophobia" ou
pelos crucifixos, a "estaurophobia". Quem tem medo de peccar soffre de
"hamartophobia". Quem tem medo do castigo, soffre de "mastigophobia"
(com "M" mesmo). Quem tem medo do materialismo, soffre de "hylephobia".
Quem tem medo da liberdade, soffre de "eleutherophobia". Quem tem medo
de mudar, soffre de "metathesiophobia". Quem tem medo de novidades,
soffre de "neophobia" ou de "cenotophobia".

Eu mesmo fui victima de certas paranoias que acabaram por confirmar-se,
taes como a "ableptophobia" (medo de ficar cego), a "escotophobia" (medo
da escuridão) e outras consequencias da condição de usuario dos systemas
de escripta typhlographica ou ectypographica, na qual me encaixo. No
livro MINGAU DAS ALMAS incluo o soneto "Typhlophobia" entre os que
compõem o cyclo "O medo a dedo".

Quanto ao leitor, depois de saber que ha tantas alternativas para ser
medroso, o sujeito acaba ficando com medo de tudo, a "pantophobia"... Ou
não é?

A proposito dessa vasta terminologia fiz este soneto:

SONETO PARA O PARASITA "PODÓFILO" [3075]

Um typico exemplinho nos ajuda
a ver como a phonetica complica:
em "filo" um "philo" e um "phyllo" ella unifica
de modo incoherente a quem a estuda.

"Podophilo" sou eu: ninguem se illuda!
Humana ou animal, a fauna rica
dos que gostam de pés o termo explica.
"Podophyllo" é p'ra planta, e a coisa muda!

Um "terio" e um "therio" a mesma coisa não
traduz, mas tudo em "tério" ora se lê.
Logar é o cemiterio à assombração.

A fera é o megatherio: acha você
que os monstros não differem? Qual, então,
o nome que às phobias alguem dê?

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